17/05/2009

Dans Le Noir

Bom, não sou crítico de restaurante mas acho que neste caso nem é tão importante já que o interessante do Dans Le Noir é a experiência e não a comida.

"Vous allez vivre une expérience extraordinaire, manger ou boire un verre dans l'obscurité totale..." é a primeira frase que você lê quando abre o site deles. Uma experiência extraordinária comendo ou bebendo na escuridão total? - Que merda é essa? - eu pensei assim que entrei no site enviado por um amigo que também morava em Paris. Olha...só tenho a dizer que foi uma das experiências mais interessantes dos últimos 500 anos...vou contar:

Primeiro de tudo é preciso ligar pra eles e agendar horário. Se chegar no lugar sem hora reservada os caras são educados mas pedem pra você virar as costas e ir embora (tenho um amigo trouxa que fez isso.) Chegamos lá e o local não tem nada de mais...uma portinha estreita no meio de uma rua escura do Marais (que é um bairro fresco de Paris). Você passa por um corredorzinho e chega em uma sala de uns 5 metros quadrados com um balcão de bar, uns armários escolares encostados na parede da direta e uma portinha na esquerda coberta por um tipo de cortina grossa vermelha. A hostess te recebe, confere seu nome e pede pra deixar tudo o que tiver nos armários - "...você não precisará de nada além dos talheres". Tá bom então, mademoiselle...Aí ela pergunta: "Menu supresa ou menu pré-escolhido?". Porra, qual é a graça de saber o que a gente vai comer? Menu surpresa, lógico! Segue o jogo, filha...Depois de uns 15 minutos entra pela portinha da cortina vermelha um negão gigante com óculos escuros. Aí é que a gente percebeu o esquema do lugar: TODOS os garçons são completamente CEGOS!! Ela colocou umas 6 pessoas em fila indiana, uma segurando no ombro da outra e o negão puxando todo mundo.

Depois de passar pela cortina você se dá conta de que agora sim tá valendo...meu, é um breu total. De olhos fechados ou abertos é exatamente a MESMA coisa! Aí eu pensei "Ah...depois que a pupila dilatar eu vou enxergar pelo menos uns vultos e tal" Não. A experiência inteira é sob uma visão 0%, nula, você não vê merda nenhuma (acho que eles pintam as paredes de preto).

Pior sensação foi quando o negão pediu pra eu esperar um pouco ali enquanto levava uns caras pras mesas. Aí ele falou alguma coisa que eu não entendi direito mas achei que ele tivesse pedido pra eu dar um passo pra frente. Na hora que eu fiz isso, senti que o braço que tava no meu ombro se soltou e eu fiquei lá parado no meio do nada, sem ver porra nenhuma, sem saber onde estavam as pessoas, as mesas, as paredes, ou seja, eu só tinha o chão que tava pisando (tato) e as vozes e sons de talheres que eu ouvia (audição). Sensacional. Foi ali que comecei a perceber que aquilo ia valer a pena.

O negão foi lá me buscar e colocou a galera sentada em uma mesa que, pelo que eu ouvi, devia ser bem longa com um sofazinho de um lado e cadeiras do outro. Bom, mas isso não interessa...Sentei lá sem enxergar nada e comecei a tatear no escuro pra descobrir o que tinha na mesa. Achei o óbvio: uns talheres, um guardanapo e um copo. Resolvi não mexer mais em nada com medo de derrubar alguma coisa e nunca mais achar. Pedimos um vinho (maaaacho) e o mais difícil foi fazer o brinde (demorou uns 10 minutos pra acertar os copos). Aí chega o negão trazendo o primeiro prato.

E a confusão? Você já comeu alguma coisa sem saber o que é?? Nós entramos no clima e resolvemos, antes de usar o garfo, tentar descobri o que era pelo cheiro. É, amigo...o olfato é um dos sentidos menos desenvolvidos que a gente tem (sei lá de onde tirei isso). Ficamos que nem mongol cheirando a comida no prato mas ninguém tava vendo a cena mesmo, então foda-se. Não descobri. Não tinha cheiro de nada! Depois comemos. Também não descobri!! Parecia salpicão de frango mas podia ser maionese com pato. Sei que tinha maçã no meio...Depois de alguns minutos você começa a se perguntar se ainda tem comida no prato...No final eu tinha que colocar a mão pra saber se já tinha acabado ou se ainda sobrava algo que o meu garfo não conseguiu prender.

Vieram o prato principal e a sobremesa (era peixe com alguma coisa e depois teve sorvete com alguma coisa) e no meio de tanta coisa nova a gente só conseguia conversar sobre os cinco sentidos: visão, olfato, audição, paladar e tato. Impressionante como o paladar é incompleto sem a visão, o olfato não ajuda quando você precisa dele, o tato tem uma precisão incrível, etc blá blá blá...Discussões interessantes incentivadas pela experiência única que a gente vivia ali naquele momento (puta frase bicha). Mas foi foda mesmo! É caro (uns 75 euros) mas eu particularmente acho que a vida é isso: passar por momentos, situações e sensações novas. Essa com certeza foi diferente e nova, e, mesmo se fosse 200 euros por pessoa, eu recomendaria a todos.

Fica aí então uma dica não de restaurante, mas de como usar e valorizar alguns sentidos na falta de outros. Às vezes só passando por situações assim pra perceber.

(texto escrito originalmente no dia 23/06/2008)

3 comentários:

Milene Reis disse...

Aí, Pampa, muito legal o post, gostei! Ta "de bem de mim" agora? :D
Bejim pro ce.

michael disse...

nem li... fiquei com preguiça.

Servílio disse...

o lugar mais tesao.